sexta-feira, 5 de outubro de 2007

Meio ambiente: Incoerência entre palavra e ações

Por Tancredo Junior

Vi, tempos atrás, um anúncio da prefeitura da cidade de São Paulo veiculado em vários ônibus, chamando a atenção dos cidadãos sobre a qualidade do ar que respiramos. O texto enfatizava o nosso dever de regular os motores dos nossos carros, para diminuir a poluição do ar causada pelo monóxido de carbono e outros agentes químicos lançados das descargas dos milhões de veículos que congestionam o nosso pesado trânsito diariamente.
Até aí tudo bem, a campanha era – e é válida, pois apregoa o bem-estar da população e orienta os motoristas menos avisados a fazerem um check-up no motor, vez em quando, não só para controlar a emissão de gases poluentes, mas também corrigir até mesmo o consumo excessivo de combustível.

O que me chamou a atenção, na verdade, foi a incoerência do anúncio, afinal não faz sentido a prefeitura convocar os cidadãos para colaborar no combate à poluição provocada por seus veículos, sendo que ela própria, que deveria dar o exemplo, têm sido – salvo erro de interpretação deste humilde cronista – talvez, a maior responsável e incentivadora da poluição. Explico: acontece que a prefeitura tem colocado de "escanteio", desde o governo Marta Suplicy, toda a frota de ônibus elétricos da cidade. E tal prática continuou com o ex-prefeito José Serra e está sendo perpetuada e avalizada pelo atual prefeito, Gilberto Kassab.
Ora, os Trolebus, como são conhecidos os ônibus elétricos, não poluem, fazem bem menos barulho, não dão aqueles desconfortáveis trancos como os convencionais (pois não possuem troca de marchas) e tem custo operacional entre 30% e 40% menores que os beberrões movidos a combustível fóssil. Então me diga, quem souber, por que cargas d'água, ao invés de manter os Trolebus circulando ou até mesmo ampliar a frota desses veículos, a prefeitura resolveu tirá-los de circulação, colocando-os em vários pátios e garagens, ao relento, enferrujando?
Além de eliminá-los sorrateiramente do sistema de transporte público, a prefeitura financiou e permitiu que os consórcios de empresas colocassem em circulação milhares de novos ônibus, e todos movidos a diesel. A única exigência feita pelo erário é que os veículos sejam novos e promete trocá-los a cada dez anos. Ah, bom. Tá certo, então. Vamos andar em veículos novos e cada vez com menos assentos – já reparou como é difícil andar nesses novos modelos, com aqueles degraus de meter medo nos velhinhos?–, desconfortáveis e barulhentos à bessa. Atualmente, uma quantidade ínfima dos ônibus elétricos, que se tornaram um dos símbolos da cidade, está em circulação em alguns trechos, limitada ao centro.

Segundo dados de um estudo realizado pelo Laboratório de Poluição, da Universidade de São Paulo (USP) divulgado no ano passado, tanto na capital paulista quanto em outras grandes cidades do mundo cerca de 80% do ozônio e 40% do material particulado lançado diariamente na atmosfera são provenientes da frota de veículos movidos a diesel.

Ainda segundo o estudo, nos dias em que a poluição é mais concentrada os moradores da cidade de São Paulo ficam expostos a “um quadro clínico de inflamação pulmonar” – traduzindo: as artérias podem sofrer um leve fechamento e ocasionar aumento da pressão arterial.

Segundo o pesquisador e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e chefe do Laboratório de Poluição, Paulo Hilário Nascimento Saldiva, morrem, em São Paulo, nove pessoas por dia, todas vítimas da poluição. Esse número representa cerca de 5% e 10% do número total de mortes na capital. Uma estatística alarmante.

Por que os governantes fingem que se preocupam com o meio ambiente e com a saúde pública, quando na verdade não dão a mínima para o fato de que a poluição nas grandes cidades é a principal causa de problemas respiratórios em crianças e idosos?

Será que eles não sabem que os níveis toleráveis pela OMS para a qualidade do ar seja de 20 micro gramas por m3 de material inalável, enquanto que em São Paulo o volume é de 40 micro gramas por m3?

Talvez seja porque o lobby da indústria automotiva e do petróleo fale mais alto, pois não justifica acabar com um sistema de transporte movido a energia elétrica, mais barato e não-poluente, optando por continuar abarrotando o trânsito de ônibus movidos a diesel, fumarentos e barulhentos.


Um projeto de implementação de uma frota movida a gás não saiu do papel. Hoje, em São Paulo, há poucos ônibus movidos a gás natural ou híbrido em circulação, em comparação com os mais de 15.000 movidos a diesel. Afinal, se a prefeitura jogou no lixo e fez de sucata centenas de Trolebus, dificilmente ampliará o número de ônibus ecologicamente corretos, muito menos no atual momento, com esse impasse envolvendo Brasil e Bolívia. A desculpa será bem apropriada: "não temos garantias de abastecimento".

Enquanto isso vamos vivendo, respirando um ar carregado de uma combinação de vários gases tóxicos. O jeito é esperar pra ver se alguma solução mais coerente que os discursos e promessas políticas seja adotada. E torçamos, com muita fé, pra que alguma coisa seja feita, senão nas próximas décadas nossos filhos e netos sentirão, com certeza, o quanto é insuportável viver em uma cidade que tem o desprazer de fazer parte da elite de metrópoles com os ares mais poluídos do mundo. Afinal, tem administrador público que acha que desenvolvimento é isso mesmo, envolve poluição, não tem jeito.

Já acabaram com o Tietê e seus afluentes, agora é a vez do nosso ar.



Tancredo Junior,

Radialista, teólogo e acadêmico de Jornalismo na UNIP

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